domingo, 27 de outubro de 2013

Rock’n’Roll Animal


Sempre achei Lou Reed tão entediante quanto todos os demais bardos (e.g. Bob Dylan ou Oswaldo Montenegro). Tive uma errônea e passageira boa impressão a seu respeito graças a dois discos fenomenais, que são na verdade apenas um.

Em 1974 Lou lançou “Rock’n’Roll Animal”, gravado ao vivo em 1973. Com Dick Wagner e Steve Hunter, 2 espetaculares guitarristas que viriam a se juntar a Alice Cooper em seguida (inclusive nos shows no Brasil em 1974), o disco é nada menos do que uma obra-prima irrepreensível. Era tão bom que em 1975 foi lançado o restante do show: “Lou Reed Live”. São álbuns que recomendo sem qualquer reserva.

No entanto, ao contrário de grande parte de meus Amigos, considero o restante da obra de Lewis Allan Reed tremendamente maçante. O fundo do poço indiscutível é “Metal Machine Music” (1975), considerado por muitos “o pior disco da história”, por outros como “uma piada”, “o cumprimento de uma obrigação contratual”, “uma experiência tão desagradável quanto uma noite em um terminal de ônibus”, “uma garantia de livrar qualquer aposento de seres humanos em tempo recorde”, etc. Em 2010 quando esteve no Brasil, LR avisou que iria tocar o MMM na íntegra no SESC Pinheiros, onde se apresentou a R$20. É obvio que uma horda de incautos que queriam ouvir “Walk on the Wild Side” esgotaram os ingressos em minutos - e depois passaram semanas reclamando daquilo que havia sido informado previamente. Foi o único show que o cara deu no Brasil; e ele tocou esta merda de 35 anos antes.

Na mesma época tive um contato pessoal que mostrou o tipo de pessoa que ele era. Noite de autógrafos de “Atravessar o Fogo”, livro com 310 letras de suas músicas na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, em São Paulo, no próprio prédio onde eu trabalhava. O horário havia sido anunciado como “rígido”: autógrafos somente das 18 às 20 horas, com um teto de 200 pessoas e no máximo 3 autógrafos por pessoa. Desci com minha senha às 17h30m e devia ser o 150º da fila, já no lado de fora do imenso saguão do prédio, na Alameda Santos. Na fila um monte de gente com discos, em especial o cultuadíssimo e chatérrimo “disco da banana” do Velvet Underground; vi também alguns exemplares de “Sally Can’t Dance”.

Lou chegou às 18h30m, atrasado, estressado e starlete. Foi para o andar superior da loja, onde era avistável através do vidro. Pediu então um cheeseburger (os boatos  e histórias circulavam pela fila). Não gostou do cheeseburger que recebeu (disseram que era do America), e pediu um outro cheeseburger de um outro lugar. Os autógrafos começaram depois das 19hs. Uma representante da Livraria Cultura percorreu a fila recolhendo os papelotes com os nomes a serem utilizados nas dedicatórias: Lou estaria “cansado”, e somente ia assinar o nome, sem dedicar nada.

Eu não comprava nada para mim, apenas para meu Irmão e um Amigo. Fui ficando putíssimo na fila com o imenso desrespeito do estrelinha para com seus fãs. Pouco depois das 20hs ele interrompeu a sessão para... meditar!!! A galera há quase 3 horas de pé na fila, respeitando o horário e esperando algum respeito, e o Transformer em OM!

Me ocorreram uma ou duas vinganças. Eu poderia levar o livro (também lançado pouco tempo antes) “Life” do Keith Richards e apresentar para autógrafo. Quando ele dissesse:
- “I’m not Keef Richards”
, eu responderia com ar supreso:
- “No??? Then I don’t want it!”
, viraria as costas e iria embora. Ou então:
- “No??? Ok, no problem, please sign it anyway...”

Outra alternativa seria dar uma escarrada na cara do desaforado menestrel  quando chegasse minha vez. Enquanto estivesse sendo arrastado para fora da Livraria, eu gritaria: “Isto é por ter cuspido em mim in Berlin (by the wall) em 1973!...”
Esta opção era mais factível - mas teria prejudicado aqueles que estavam atrás de mim na fila.

Fui recebido pouco depois das 21 horas. Ignorando as recomendações, apresentei  o papel com o nome de meu Irmão, e pedi:
- “Could you please dedicate it? It’s for my Brother, who deep down inside has got a Rock’n’Roll Heart...”
Com uma letra tíbia (não sei dizer se de um recém-saído do Mobral ou devida à exaustão de já ter autografado umas 400 peças) ele escreveu: “To Gauco...”

Tentei ainda uma segunda dedicatória para um Amigo, apresentando um segundo papelote com o nome “Ronaldo” e dizendo “For me!”, mas o trovador disse ’’oh, no” e somente assinou o nome com aquela letra trêmula.

“Rock’n’Roll Animal” e “Lou Reed Live”. Você não precisa ouvir mais nada dele.

Nem deve.


(27/out/2013, Rio)


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