sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Eleições

"Votar não se trata de eleger o melhor, mas simplesmente de escolher o menos pior."
(Winston Churchill)

"O maior castigo para aqueles que não se interessam por política é que serão governados pelos que se interessam."
(Arnold Toynbee, citado por Dora Kramer)

(out/2010)

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

O Gol Mil do Pelé

Eu tinha 13 anos de idade no dia 19 de novembro de 1969, quando Papai me levou ao Maracanã para assistir àquele Vasco da Gama x Santos.

O País vivia há semanas a sensação do Gol Mil do Pelé (era assim que era chamado, e não "Milésimo Gol" ou qualquer outra variante). Todos acompanhavam a contagem regressiva. Quando chegou a 999, a expectativa transbordou. Mas o gol não saía.

Antes daquele confronto contra o Vasco, o Santos jogou contra o Bahia. Mas o gol não saiu, tendo o Pelé inclusive chutado uma bola no travessão (houve quem o acusasse de ter mirado na trave só para que o Gol Mil acontecesse no Maracanã!). E a torcida do Vasco foi presenteada com o jogo mais esperado do ano.

Meses antes o Papai tinha vaticinado: - "Vai ser contra o Vasco". Eu era um tremendo fã do goleiro vascaíno, o argentino Andrada, uma muralha de encher os olhos de qualquer torcedor, e principalmente os de uma criança. O único goleiro tão bom quanto ele era o Andrada de chumbo de meu time de botões!

Jogo à noite. Foi uma das poucas vezes que me sentei no lado oposto ao habitual da torcida do Vasco, e ainda assim estava cercado por torcedores do Vasco. Ou talvez não: não sei dizer quantos daqueles (oficialmente) 65 mil torcedores eram cruzmaltinos; à época, me pareceu que todos eram. O Vasco abriu o placar no primeiro tempo, e o Santos empatou no início do segundo. Próximo ao final do jogo, quando parecia que mais uma vez o Gol Mil não sairía, penalty contra o Vasco! Ele não queria bater, mas a torcida urrava: -"PELÉ! PELÉ!". Eu era criança, e não queria ver o Vasco perder. Não queria que ele fizesse o gol (o que mostra como é raso o raciocínio de uma criança). Mas Pelé foi convencido, talvez até para acabar com aquela expectativa que deixava a ele, ao time do Santos, às torcidas e a todo o País em total ansiedade. Na hora de cobrar, todo o time do Santos ficou atrás do meio campo! E se o Andrada rebatesse?

Antes da cobrança. Andrada passeia abraçado a Pelé na entrada da grande área, e conversa com ele em um intrigante tête-à-tête. Fiquei curiosíssimo (e até hoje ainda sou) sobre o que o goleiro do Vasco - pois só ele falava - estaria dizendo para ele.

Excitação domada, a torcida se senta. Pelé cobra o penalty: Andrada se estica todo, e quase agarra! Mas é gol, e a torcida pula, grita GOL!, pela primeira - acho que única - vez na vida eu vejo a torcida do Vasco comemorar um gol que o time sofreu, pela primeira e única vez na vida eu fico sentado na arquibancada vendo um monte de bundas pulando quarenta centímetros à minha frente. E é claro que me levanto também.

Depois de muita festa, antes do jogo recomeçar, soam os auto-falantes do Maraca (a sonoridade com eco dos auto-falantes do Maracanã é inesquecível, quem a ouve uma única vez se lembrará para sempre, quem ouve milhares de vezes passa até a anunciar alterações em jogos de futebol de botão com a mesma entonação):
- "SUDERJ IN-FOR-MA! SUBSTITUIÇÃO NO SANTOS: ENTRA FULANO; SAI..."
Suspense. O Radialista se alonga na pausa, propositadamente demorando para dar a informação que vai acabar com o jogo:
- "... PELÉ!"

A torcida do Vasco não se importou com a derrota (só eu); e hoje me orgulho de ter presenciado aquele momento. Durante anos o Papai carregou na carteira o ingresso do jogo, para pegar nele um autógrafo do Pelé no dia que o encontrasse. E eventualmente o Papai realmente o encontrou; mas esta já é uma outra história...

(out/2010)

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A Pedra e a Receita

Penso que é comum aprendermos com um erro somente quando o cometemos pela segunda vez. Apenas quando conseguimos comparar os pontos em comum nas duas trilhas que levaram ao desastre é que conseguimos apontar: ah, foi AQUI que eu errei!

O mesmo acontece com algumas doenças mais complicadas. Foi apenas quando tive minha segunda crise renal é que entendi que já tinha tido uma primeira 8 anos antes, além de um outro aviso de médio porte no meio do caminho.

Domingo de eleições. Chego de madrugada ao Rio para votar. Estou preparando o café da manhã, e a dorzinha que vem me incomodando há alguns dias inicia um crescendum que intuo só irá acabar no Hospital. Abandono o desayuno pronto na mesa antes mesmo de tocá-lo e parto para um banho rápido, pois não sei o que tenho e portanto não sei quando terei oportunidade de um outro. Aviso a Papai & Mamãe que ao invés de irem à Missa eles me levarão ao Hospital.

Chego à Casa de Saúde devastado, mas lá eles não atendem este tipo de Emergência, e me arrasto até o carro para ir a outro Hospital. Nas ruas a eleição fervilha; o tempo não pára, mas o trânsito sim. Passamos por um Cemitério e me dá vontade de ficar logo por ali, com tudo resolvido; mas em breve chegamos ao Hospital que me recebe com uma cadeira de rodas, antes de me transferir para uma maca.

A dor é como uma pontiaguda vontade de urinar que vai crescendo sem nunca mais parar. A alturas tantas o organismo perde o controle do que está acontecendo, não mais sabe o que se passa - e começo a vomitar. Em seco, pois estava em jejum. Contrações fortes, vomito, vomito e não sai nada; a boca fica toda babada, e é só. Meu Irmão avisa que daqui a pouco estarei vomitando bilis. Mas felizmente o organismo entende que esta reação também não adianta, e desiste dos engulhos.

Um pouco mais tarde, já medicado, ouço uma Enfermeira que comenta:
- "Dizem que as duas piores dores são a do parto e a da crise renal. Mas eu já tive dois filhos, e o que senti não chega aos pés deste estado em que vejo vocês chegarem aqui..."

Saio do Hospital com missão de procurar um Urologista. Ele me dá uma animadora notícia:
- "Se a criança não sair de parto natural dentro de alguns dias, teremos que partir para a cesária..."

O passar dos anos vai te deixando acostumado com o rolar ladeira abaixo, e fazer xixi em um coador é apenas mais um degrau nesta escada descendente.

Mas o coador funciona, e capta uma pedrinha! (Igualzinha à que vi em um desenho no consultório do Urologista).

Em uma última consulta, o Xamanz me alerta:
- "Você tem mais algumas areias nos rins, e deve se hidratar bastante para tentar limpá-los. Beba bastante líquidos. Cerveja..."
- "Muita água?", pergunto eu.
- "Cerveja."
- "Chá?"
- "Cerveja."
- "Água de côco?"
- "Cerveja."
- "Suco de Melancia?"
- "CERVEJA!!!"

(out/2010)

sábado, 9 de outubro de 2010

Um Panda em Rapa Nui

Dear Friend,

"Um Panda Em Saturno" entra em recesso por um breve período, em função de retiro em um dos pontos mais ermos desta nossa Shikasta.

Em um exercício corporativo em 2001 fui questionado quanto a meu objetivo de vida.
Passados quase 10 anos, a resposta permanece a mesma:
- "Conhecer o Universo. Mas por enquanto me contento em conhecer este Planeta."

(out/2010)


sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Antártica ou Antártida?

Uma vez que já fui ao "continente branco", sou comumente indagado se sei a resposta à pergunta "o certo é Antártica ou Antártida?". Não encontrei a resposta em nenhum iceberg ou tampouco na boca de algum pingüim, mas prestei bastante atenção ao assunto, e apresento minha especulação pessoal a respeito.

O nome Ártico (do Pólo Norte) deriva da palavra grega "arktikos", que significa "urso". Isto tanto pode se referir aos ursos brancos que habitam o Pólo Norte como às constelações Ursa Maior e Ursa Menor, que ficam no Hemisfério Norte (a Ursa Menor inclusive é a constelação que contém a Estrela do Norte, que fica "estacionada" acima deste Pólo).

No lado diametralmente oposto da Terra fica portanto... o Anti-Ártico, ou Antártica. Este me parece ser o nome correto.

De onde viria então a corruptela "Antártida", que se vê em todo canto no Ushuaia e é largamente utilizada em Português e Espanhol? Creio ser fruto da combinação de "Antártica" com "Atlântida" resultando "Antártida", com um generoso tempero de Ignorância no que se refere à origem da palavra.

Uma viagem à Antártica é uma lembrança mágica em uma vida. Um mundo intocado pelo Homem: pingüins, leões marinhos, focas, lontras e demais animais não aprenderam a ter medo do Homem, e se aproximam de nós sem a menor cermônia. É emocionante passear por dentro das colônias de pingüins, verdadeiras cidades. Fora o tremendo alarido que eles fazem ,"conversando" sem parar, todos se manifestando ao mesmo tempo, em uma algazarra da qual vou sentir saudades pelo resto de minha vida.

É possível optar por 2 diferentes "conceitos" de viagem. A travessia do Drake (os 1.000km de mar entre a América do Sul e a Antártica) pode ser terrível, pois trata-se do encontro de dois oceanos e um mar: o Oceano Atlântico (alguém diria "Atlântido"? Faria até mais sentido...) com o Oceano Pacífico mais o Mar Antártico - em resumo, são os 1.000km do Mar mais sacudido que você vai encontrar em sua vida. A travessia leva de 2 a 3 dias, e você pode optar por ir em um navio grande, estável e confortável de 500 passageiros ou então em um quebra-gelo de 87 passageiros, como eu & AMB optamos. Mas a diferença vai além da estabilidade da travessia do Drake: na Antártica são permitidos desembarques de no máximo 100 passageiros por vez (o que se dá através de barcos tipo "zodiacs" para +/- 8 passageiros). Assim, se você vai em um quebra-gelo, consegue desembaracar todo mundo ao mesmo tempo, o que habilita 2 ou 3 desembarques a cada dia; já em um cruzeiro do tipo Queen Elisabeth com 500 pessoas, serão necessários 5 turnos de 100 pessoas, e acaba ocorrendo apenas uma visita por dia. A escolha é sua... mas saiba que no Drake tivemos praticamente TODO MUNDO passando mal, até mesmo o Médico! É necessário colocar suas coisas no chão da cabine, mas mesmo assim ela passam a noite rolando para lá e para cá, e a cada 3 minutos se chocando violentamente em uma parede diferente da cabine. Além da tripulação eu fui o único a não passar mal (thanks, God-inho!) e assim passava os dias e noites (pois era impossível dormir) da travessia nas cabines de comando ou em salões desertos, ou então vendo a fúria do Drake pelas escotilhas. Para se ter uma idéia, uma das muitas ondas que cobriam nosso Antarctic Dream chegou a QUEBRAR uma das janelas em nosso deck, encharcando e enregelando um casal holandês que lá estava - note que o navio era um quebra-gelo! Repito: a escolha é sua...

Outra curiosidade são os banhos de mar. Você tomaria banho de mar no meio de icebergs? Quem toma ganha um Diploma, e isto despertou o interesse deste Mané. Ao longo da jornada (foram 2 dias de ida, 6 no Pólo Sul e 3 de volta) 3 heróis mergulharam, sob os aplausos de todos. No último dia teríamos um mergulho organizado pela tripulação na "Deception Island". Lá chegando, havia uma tempestade de neve. Fizemos um trekking sob fortíssimas ventania e nevasca, e chegamos à borda de uma cratera de vulcão. Voltamos à praia do desembarque, e até os pingüins tinham sumido. A tripulação cavou uma piscina-banheira, que ficou cheia de água vulcânica a uns 70º de temperatura. Estava PELANDO dentro da piscinita, e congelando fora dela! AMB desistiu do "mergulho", e apenas eu e mais uns 15 outros boçais entramos e lá ficamos queimando os bagos e congelando as costas e peitos. Não dava para ficar dentro da água e nem sair!

Quando voltamos para a cabine, lá estavam dois diplomas. Fiquei puto: AMB tinha se inscrito para o "mergulho" mas desistiu na última hora, então era injusto que ela também recebesse o Diploma; quanta desorganização! Mas o Diploma dela era um atestado de Inteligência e Raciocínio, ela era parabenizada pela racionalidade de ter desistido da "façanha"; já o meu era um Diploma De Inacreditável Imbecilidade, ressaltando que nem mesmo os pingüins estavam se banhando naquele momento...


(fotos: repousando no deck do cruzeiro /zodiacs e o Antarctic Dream / casal de pingüins / cidadela de pingüins / lontras / cratera de vulcão em Deception Island / banho que vale um Diploma)

(set/2010)

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Saída Para Uma Situação Sem Saída

Existe uma situação na qual você fatalmente só se dá mal.

É quando conta para alguém alguma coisa que não deve ser divulgada.

A partir daí, se você disser "não conte para ninguém", ou então "fulano/a não pode saber", com certeza vai ouviu um desaforado:
-"Mas é ÓBVIO que eu não vou contar, o quê você acha que eu sou???"

Por outro lado, se não der nenhum aviso, a pessoa vai sair contando a história para os outros, e quando você for questioná-la vai te responder:
-"Ué... Mas você não disse que não era para falar!"

Esta situação só tem duas soluções:
- ou você dá o 'warning' ANTES de contar o tal segredo, ou
- não conta nada (que é a melhor política).

"Segredo entre três pessoas só está bem guardado quando duas delas estão mortas."


(Nota - na verdade a frase "você não disse que não era para falar" incorre em erro básico, pois uma dupla negativa não é uma justificativa. Mas isto é amplamente ignorado, e usa-se a rodo "eu não sabia que não podia...", como se ignorância fosse desculpa. Neste caso, a resposta adequada é "não é por alguém não saber que o fogo queima que ele vai deixar de queimá-lo".)

(set/2010)

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Heleno e Tesourinha

Esta história aconteceu na década de 40, e me foi contada por meu Pai. O Campeonato Brasileiro era então disputado pelas seleções estaduais. Tínhamos confrontos entre os “scratchs” gaúcho, mineiro, carioca, paulista, etc, e para que um jogador atuasse por um Estado não era necessário ter nascido nele, mas sim estar atuando naquele Estado naquele ano. Mas por mais encarniçados que fossem os certames, as finais eram sempre as mesmas: Cariocas versus Paulistas.

Em uma destas finais, Heleno de Freitas (que jogava pelo Botafogo) e Tesourinha (Vasco da Gama) eram titulares da Seleção Carioca. O Estádio de São Januário (o Maracanã ainda não estava construído) assistiu a uma jogada espetacular do Heleno, que driblou metade da Seleção Paulista e deixou Tesourinha solto na cara do gol. Mas Tesourinha errou a finalização, chutando para fora. Heleno ficou furioso e passou uma verdadeira descompostura em Tesourinha; todos no estádio viam sua gesticulação agitada e furiosa. Tesourinha abaixou a cabeça e se afastou.

Na jogada seguinte foi a vez do Tesourinha driblar meio time paulista, investindo pela ponta direita como se fosse o Garrincha. Ele deixou Heleno solto no meio da área, de cara para o gol com a bola limpa e completamente sem marcação. Mas Heleno errou o chute, e isolou a bola por cima do gol.

Tesourinha se aproximou dele e simplesmente lhe deu dois tapinhas nas costas, e se afastou...

(aniversário do Papai/2010)

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Em Outras Condições

Um dos mais tocantes elogios que recebi na vida veio de uma mendiga imunda, desgrenhada, mulambenta e cujo cheiro era condizente com esta descrição.

Tarde de domingo, eu estava na Rodoviaria Novo Rio aguardando o ônibus que me levaria para São Paulo. Bebia uma água mineral com gás no boteco ao lado do embarque. Observei a Mendiga rondando pelos 3 botecos que ficam ali. Devia ter cerca de 30 anos, e poderia até ser bonita, mas para tanto precisaria passar primeiro por meia hora de banho em desinfetante, pois seu estado era realmente lastimável. Conseqüentemente, todos a tratavam muito mal.

Ela se aproximou de mim. Falava com bastante calma, não era agressiva nem insistente, abordou-me educadamente. Pediu-me que lhe pagasse um refrigerante. Normalmente não dou nada, mais para evitar alimentar este tipo de comportamento pedinte de que por ser mão-de-vaca. Mas a quase-fineza de sua abordagem contrastava muito com modo que vinha sendo tratada pelos demais transeuntes, e me sensibilizei. Dei-lhe 5 reais (posteriormente me arrependi, pois ela realmente parecia estar precisando de mais), porém acho que o que a tocou não foi o dinheiro mas sim o fato de ser tratada de forma igualmente educada.

Ela agradeceu e se afastou rumo a outro Bar. No meio do caminho parou, deu meia volta e veio falar novamente comigo:
-"Sabe, eu gostaria de ter te conhecido em outras condições."

Fiquei sem palavras enquanto ela se afastava. A resposta só me ocorreu quando já dentro do ônibus: eu também gostaria de tê-la conhecido em outras condições.

(set/2010)

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Metal Progressivo

Li certa vez que "o Heavy Metal é o hobby dos fãs de Rock Progressivo, e o Progressivo é o hobby dos Metaleiros".

Concordo. Em muitos trechos de suas músicas as Bandas Progressivas descambam para a pancadaria. E da mesma forma muitos trechos do Metal são verdadeiras suítes progressivas.

Sempre fui um Progressivo, com o Heavy Metal como hobby.

Mas de um (bom) tempo para cá, o Rock Progressivo é que se tornou meu hobby...

(out/2010)

As Desvantagens da Beleza

Muita beleza e gostosura acabam sendo karma ruim para uma pessoa. Por quatro motivos:

- Ao invés da meia ou uma dúzia de pessoas que em média realmente se interessam por alguém ao longo de uma vida, a gata-avião gostosérrima terá à sua volta centenas de gaviões permanentemente rondando, cercando e azarando. Descobrir entre eles quem é The One será muito mais difícil, pois tal oceano de interferências inevitavelmente inibirá a sensibilidade;

- Exercer poder de sedução é bom e viciante, e será difícil para a Linda Mulher parar com o brinquedo - mesmo se tiver encontrado O Cara Certo;

- A pessoa muito bonita tende a querer alguém igualmente muito bonito, o que reduz o universo amostral - e conseqüentemente as chances de acerto;

- Como se diz, "Amor que vem com a Beleza, vai com a Beleza".

Portanto, caro/a Leitor/a, quanto mais feio/a você for, mais abençoado/a por Deus será!

(set/2010)

sábado, 2 de outubro de 2010

Images and Words

"Uma imagem vale por mil palavras.
Mas tente dizer isto com imagens!"

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Marcio Contra o Vulcão (Parte I)

(Embora esta história tenha ocorrido na primeira semana de 2003, até o momento em que a redijo - setembro de 2010 - ainda não existe uma Parte II para ser contada.)

Uma das mais impressionantes e espetaculares viagens que fiz foi ao Deserto de Atacama. Não à toa os sábios, loucos e iluminados buscam o deserto, lá permanecendo por longas temporadas. Passei no Atacama o Reveillon de 2002/2003 e as duas semanas seguintes. As vivências desta viagem foram profundamente marcantes, no Deserto não há como evitar uma avassaladora invasão da Espiritualidade, as conversas com as Divindades são intensas, em uma troca direta e objetiva que chega a ser um diálogo. Espero algum dia registrar adequadamente toda a experiência; por enquanto uma página-resumo está no texto "As Cores do Deserto", postado neste Blog em set/09. Relato a seguir três momentos distintos desta viagem que se fundem em uma experiência única que tatuou minha Alma.

No dia 4 de janeiro de 2003 fiz o belíssimo passeio das LAGUNAS ALTIPLANICAS, a mais de 4.400 metros de altitude, com caminhadas por lugares inesquecíveis e de cores inacreditáveis. Durante uma de tais caminhadas avistei algo que parecia um vulcão, com um cume cônico uns 400 metros acima do nível em que estávamos. Um alarme interno soou: desde "Joe Contra O Vulcão" sonho subir um, e ali - a 'walking distance' - estava uma oportunidade. Expliquei para o Guia da excursão que gostaria de me desligar do Grupo por algumas horas: eu subiria o vulcão enquanto eles faziam um outro passeio que era parte da programação, e os encontraria na volta em local e horário que combinamos. Ele deu o OK, dizendo que "uma perda de 10% dos turistas é aceitável em um tour"... Ressaltou no entanto que minha impressão era falsa, pois a montanha era mais alta do que parecia e naquela altitude o esforço seria muito maior. Nada me demoveu; felizmente um francês (Hugues) optou por me acompanhar, declarando que "ninguém deve ficar sozinho na montanha".

Foi uma sucessão de coisas que deram errado, como uma fortíssima ventania de areia finíssima que entra nos olhos e a perda dos óculos de proteção. Mas o pior problema foi a exaustão absoluta: cheguei a um ponto de cansaço que a cada subidinha de 3 metros eu precisava parar por 5 ou 10 minutos para me recuperar. Aproximava-se o horário de retornar, e afinal, a cerca de 30 metros do cume (Hugues tinha parado uns 50 metros antes) optei por desistir da tarefa que levaria ainda mais de 1 hora, apesar da proximidade. Imaginava então que a descida fosse ser fácil, mas nada disto: estava no limite das forças, com reservas zeradas, e a cada 50 metros que descia eu deitava e morria, ou queria morrer, até que em uma das paradas o Hugues (que eu já reencontrara) sugeriu uma pequena siesta. Dormi na encosta do morro, e em resumo a descida levou as mesmas 3 horas da subida, cheguei ao ônibus com a cabeça estourando e o corpo fervendo.

Quais as lições? Primeiro que uma cagada nunca tem cara de cagada, no começo parece um desafio interessante, aí você vai se envolvendo e se aprofundando até que chega um momento em que não está mais se aprofundando mas sim se atolando. Como distingüir uma cagada de um desafio? Não tenho a mínima idéia, pois as pessoas te alertam que é perigoso em ambos os casos. Esta história poderia ter sido uma bela aventura com uma cratera de vulcão no topo como a cereja do bolo, mas acabou sendo um quase-desastre com um insucesso no meio.

Uma segunda lição é a do limite pessoal. Não utilizar toda a s forças, energias, reservas ou o que seja, pois depois você pode precisar de muito mais do que imagina. É a lição dos gatos, que sempre deixam um pouco de comida no prato até que seus donos cheguem da rua. Também esta é uma lição de muito difícil ajuste fino, pois existem situações em que é efetivamente necessário irmos até o limite. Como saber se iremos necessitar mais do que aquele limite que imaginávamos?

E a principal e mais difícil lição: saber desistir. O reconhecimento de que não podemos atingir algumas coisas (além das Mulheres). Esta lição fiquei orgulhoso de ter aprendido, Marcio Contra o Vulcão Parte I não foi afinal um fracasso total, não me frustrei por não ter atingido o cume, até me orgulhei por ter ido até o limite e ter retornado sem conseguir, por ter compreendido que o cume do vulcão estava além de meu máximo. (Talvez não haja tanto motivo para orgulho, pois não foi minha cabeça quem decidiu, e sim o corpo é que impôs sua limitação à mente).

Mas aprendi uma coisa: EU TENHO QUE CHEGAR À BOCA DE UM VULCÃO! (Em janeiro de 2007 cheguei à boca de uma cratera na Antartica, mas ainda não foi aquilo que desejo.)

Esta história não termina aqui: Deus não deixa barato, e mandou ver logo em seguida para saber se eu tinha aprendido a lição!

Tirei o dia seguinte como day-off, e passeei pelo povoado de San Pedro de Atacama - quase um oásis - fazendo turismo, compras, comendo muito bem e fazendo passeios curtos. É interessante porque para lá vão turistas "rapaziada-galera" do Mundo inteiro, e ali se alojam por 2 ou 3 ou mais meses. Neste período arranjam trabalho nos hotéis e restaurantes, e assim temos uma grande rotatividade de cozinheiros extremamente variados e criativos, e de diversas partes do Mundo - parece mesmo haver uma competição entre os Restaurantes para ver qual apresenta o melhor e mais criativo Cozinheiro. Melhor para que os freqüenta, pois comi muitíssimo bem lá, coisas que nem imaginava e que dificilmente vou encontrar novamente.

Eu revezava dia de aventura / day-off, e assim no dia 6/jan chegou a vez de me aventurar novamente. Optei por ir a uma antiga aldeia que estava sendo desenterrada no meio do deserto, as RUÍNAS DE TULOR, a cerca de 11km ao sul de SPA. Me equipei profissionalmente, mandei para as cucuias os conselhos de seguir pelo caminho mais fácil e óbvio (a carreteira, imagine só fazer 11km de deserto por cima da estrada de asfalto!), e optei pelas quebradas, meio do mato, leito de rio seco, sendas, etc. Em resumo, foi meu segundo fracasso consecutivo: um SΘL causticante, calor inacreditável, nem um arbusto ou sombrinha, e após muito andar e suar e sofrer, o coração começou a disparar, bateu taquicardia, no vulcão tinha ficado a 130 bpm por muito tempo (daí a siesta), pois aqui foi a 160. A carretera estava distante, mas como o coraça não melhorava resolvi caminhar até lá, me arrastei escaldando, quando cheguei encontrei um pontilhão, me abriguei debaixo dele, tumtumtumtumtumtumtum, 160 firme, pensei agora fudeu, escrevi no diário algumas famous last words (não é meu único diário de viagem que tem uma despedida...) e fiquei esperando o piripaque. Como o coração não desacelerava e nem o piripaque vinha, resolvi comer um plátano, última ceia, "nada se parece mais com um homem do que a forma de sua morte" disse GGM, um piripaque no deserto seria legal, mas "morreu engolindo bananas" nem tanto.

Após meia hora de descanso debaixo do pontilhão no meio do nada infernal o corpo começava a ficar legal. Recomecei a perambular ao SΘL e após uns 2km descobri que a porra do mapa que haviam me dado na operadora de turismo estava errado! A esta altura já eram 15h30m e eu talvez ainda conseguisse chegar às ruínas, no limite do horário e das forças. Mas considerei que este era um teste cósmico - Deus verificando se eu tinha aprendido a lição do vulcão - e tremendamente decepcionado voltei para o Hotel em San Pedro de Atacama.

Naquela noite, frustradíssimo e desanimado após dois insucessos seguidos, escrevi em meu diário:
"Cheguei em SPA às 5½da tarde exausto, sem ter feito porra nenhuma a não ser mostrar para God-inho que aprendi a lição do vulcão: tornei-me um cagão. Mas convenhamos, God-inho: TAQUICARDIA?!? Tenha a Santa paciência! Assim é sacanagem, assim é covardia... Oh Pai, oh Pai, por quê me abandonastes?"

No dia seguinte optei por um passeio a PUCARA DE QUITOR e ALTOS DE CHULACAO. A curiosidade ficou por conta do Senhor que cobrava ingresso na entrada da Pucara. Ele apontou para algumas nuvens ao longe, e afirmou entusiasmado:
-"Está chovendo na Bolívia!"
Realmente de lá se avistava muitos quilômetros de distância. Ainda por cima o Chile é estreito, de forma que além da Bolívia ele também me mostrou o Peru. Esta história me lembra uma conversa com o Guia às Lagunas Altiplanas: perguntei-lhe se em San Pedro chovia, e ele respondeu:
-"Mas claro! Todos os anos!"

Passeei pela fortaleza de terra batida (pucara = fortaleza) e a seguir comecei a enorme subida para os Altos de Chulacao, um mirante ("mirador") que há muito tempo me atraía, pois era avistável de todos os pontos de San Pedro. Às três e meia da tarde, com o SΘL a pino, cheguei até lá em cima...

... e tive a vista mais espetacular de toda a viagem!!!


EL VALLE DE LA MUERTE, inteiro, enorme, colossal, extraterreno, vermelho, escamoso, gigantesco, todo à vista, todo a meus pés. Eu absolutamente sozinho, no absoluto silêncio, perto do Céu, com aquela visão cósmica esparramada à frente, como nosso Planeta é maravilhoso, como o Deserto é maravilhoso, fiquei extasiado, atônito, deslumbrado, emocionado. Gastei 1 rolo inteiro de filme naquele lugar.

Continuei subindo até o mirador, com uma construção moderna bem no alto, um muro redondo em volta de 4 cruzes que se complementavam, um belíssimo monumento, eu estava novamente feliz por estar ali, andando pelo Céu totalmente integrado e realizado, a mesma sensação de Joe náufrago de frente para a Lua nascendo no horizonte agradecendo a Deus por sua vida que se esgota (a imagem que ilustra este Blog). No meio de toda aquela emoção fui examinar as 4 enormes cruzes. E nelas estava escrito em 4 diferentes línguas (uma das quais o Português):
"OH PAI, OH PAI, PORQUE ME ABANDONASTES?"

Um tapa na cara.

Eu não sabia se ria ou se chorava.

Optei por tirar fotos.


(Nota - alguns dia depois cheguei até as Ruínas de Tulor, indo de bicicleta.)

(Fotos: Hugues na encosta do vulcão / Rumo à Aldeia de Tulor via leito de rio seco / "Está lloviendo en Bolívia!" / Vista rumo ao mirador (esquerda e direita) / No caminho do mirador dos Altos de Chulacao / Monumento em cruzes)

(set/2010)