terça-feira, 21 de maio de 2013

VAN DER GRAAF GENERATOR (ou quase) na Virada Cultural SP 2013 (3 de 3)


(Palco São João, domingo 19 de maio de 2013, 18hs)

Quando eu soube, foi difícil acreditar: DAVID JACKSON iria tocar na virada Cultural! O saxofonista de meu venerado VAN DER GRAAF GENERATOR, banda progressiva que considero a mais complexa de se entender e gostar. Cabem algumas explicações: egresso dos anos 70 (claro), o VdGG era formado por 2 tecladistas, um baterista e este saxofonista. Sempre tive imensa dificuldade em alcançar a profundidade de suas músicas, sendo que no caso de alguns álbuns cheguei a levar décadas para entender (parcialmente); no caso de outros, continuo tentando! O que acaba sendo um alívio no marasmo que se tornou a Música, que se soma à covardia de bandas antigas e famosas ainda em atividade que repetem ad nauseam setlists exauridos há décadas.

O grande gênio e mentor é (pois o VdGG continua ativo) o compositor Peter Hammill. David Jackson deixou a Banda em 2006, e eu não tinha idéia do que passou a fazer a partir de então.

Terminado o show do NEKTAR, eu dispunha de um intervalo de 30 minutos. Dos banheiros químicos mais próximos escorria um volumoso carpete de urina, exalando um odor de uréia que deixava a área inaproximável. Em busca de banheiros menos entupidos e fétidos acabei vagando pela Avenida São João. Damas da noite, travestis e demais habitueés faziam suas festas, passeando, bebericando, curtindo, acompanhando os eventos. Muitos casais homo, talvez a maioria. Parei no simpático boteco Cantinho da Mesquita onde uma TV passava ao vivo os 15 minutos finais de Santos x Corinthians, a final do Paulistão. Pedi minha bebida de sempre (vodka com suco de maracujá coado e açúcar), que o barman “deixa comigo!” preparou nas seguintes proporções: meio copo (dos grandes) com maracujá coado, açúcar e gelo; e o restante meio copo (dos grandes) de smirnoff. Desnecessário dizer que 6 horas mais tarde eu ainda estava bêbado... Encontrei um cara com uma camiseta do Van der Graaf. -“Como você conseguiu?”, perguntei estupefacto (pois não encontro camisetas deles nem em Londres); “mandei fazer, é claro!” foi a resposta, é claro. Estava acompanhado por um corinthiano que deixou de ver a Final para assistir NEKTAR e DAVID JACKSON:
- “Perder isto? COMO???”

Acompanho o jogo até o fim, saio do Cantinho da Mesquita e me dirijo ao palco com sua exígua audiência. Vejo outro cara com outra camiseta do Van der Graaf, me aproximo e repito a pergunta: -“Como você conseguiu?”. A roda de amigos se abre e lá estão os mesmos dois que eu encontrara no boteco. -“Olha ele aí de novo!”, me saúdam, e o que se segue é uma saraivada: -“Ele é a cara do Peter Hammill!”; “vamos tirar uma foto com o Peter Hammill”, etc. Já fui confundido com o Ritchie em um show do Marcelo Nova, agora virei Peter Hammill. (E a resposta a minha pergunta foi a mesma: -“Mandei fazer, é claro”. É claro.)

Às 18h15m, David Jackson e a italiana ALEX CARPANI BAND ocupam o palco. A Itália foi o país onde o VdGG fez mais sucesso. Não gosto de sax (que chamo de “cornetas”), mas não sabia que existiam tantas lágrimas dentro de mim até ver e ouvir David Jackson tocando a 10 metros de distância. Tocavam Van der Graaf Generator; era um show de covers somente de músicas do VdGG!!!

Ao final da primeira música, a platéia grita algo que jamais imaginei ouvir (ou gritar):
- “AUMENTA O SAX!”
Apresentações (em italiano):
- “Em homenagem a vocês, hoje estamos com um baixista brasileiro: Gabriel Costa, do VIOLETA DE OUTONO!”

A segunda música é “Sleepwalkers”. A noite cai, a smirnoff sobe, a emoção domina: o show é ESPETACULAR!!! Existe vida inteligente neste Planeta, afinal; e boa parte está concentrada na frente do Palco São João às 19hs deste domingo.

Quase toda grande Banda se baseia em 2 gênios (Page & Plant, Jagger & Richards, McCartney& Lennon), e o VdGG tinha Peter Hammill & - agora descubro - David Jackson. Não eram apenas as composições, afinal; a interpretação do corneteiro fazia TODA a diferença na música do Van der Graaf. Pois aqui os arranjos com uma banda completa (incluindo guitarra e baixo) e com uma galera jovem e cheia de energia mostra que o movimento de Mr. Jackson foi brilhante: as versões são nada menos do que primorosas, e o show é entusiasmante. Evidencia que Peter Hammill é o maior gênio musical de nossas existências. Tocam “Refugees”, e o que já era um choro descontrolado se torna convulsivo. Jamais chorei tanto em um show, jamais fiquei tão completamente emocionado. Muita gente nova olha mais para mim do que para o palco, e imagino que esteja imaginando: “what the fuck?!?”.

Foi uma demonstração de extrema coragem e conhecimento dos organizadores da Virada trazerem o NEKTAR e o DJ+ACB=VdGG; minha gratidão e reconhecimento.

David brinca com a platéia:
- “We were told not to mention Argentina here...”

Tocam “Killer”. David toca 2 saxofones simultaneamente - sua marca registrada - quase o tempo todo.

Entram então os mais de 10 minutos de “Man-Erg”. A música de minha vida, com sua melodia gloriosa e letra idem (♫♪♫ “The Killer lives inside me... / The Angel lives inside me... / I too, live inside me...” ♫♪♫) . Meu coração não resiste. Estou morto. A partir daí você pode até pensar que está conversando comigo, mas se engana: marcio ficou naquela platéia, naquele show, naquele palco. O marcio (se) acabou ali.

No solo de bateria, toda a banda se abaixa, senta, ajoelha, para que somente o batera seja visto; belo gesto.

O genial bis encerra com “Theme One” e David comanda a platéia: tocando uma flauta quase infantil, faz com que todos cantem o lá,lá-lá-lá-lá-lá do ritmo original da canção; e então ele nos acompanha! Absolutamente simples, majestoso e tocante; absolutamente lindo.

O show acaba às 19h40m. A Virada já terminou, os banheiros químicos já foram retirados, sigo para a Praça da Bandeira em busca dos ônibus mas o Centro já está bastante deserto e começa a ser ameaçador. Após 2 shows deste quilate seguidos, estou emocionalmente destroçado.

Ouça “Refugees”, ouça “Man-Erg”, e você conhecerá Van der Graaf Generator. Conhecerá Peter Hammill.

Me conhecerá.


(Nota 1: não saiu NENHUMA nota no jornal sobre estes dois shows primorosos, seja antes ou depois dos eventos, ilustrando aquela consideração sobre a dificuldade em encontrar vida inteligente neste Planeta.)

(Nota 2: eu sei que “inaproximável” não existe, mas é a palavra que melhor exprime aqueles banheiros.)

4 comentários:

  1. Deve ter sido um showzaço! Será que dá para ter esperança de que tragam Hawkwind ano que vem?

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  2. Veja no youtube:

    Man Erg
    http://www.youtube.com/watch?v=ve9TACqTUuM

    Refugees
    http://www.youtube.com/watch?v=2KUr4Jii6eE

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  3. Cara obrigado por postar isso aqui. Pelo menos uma nota sobre o grande show! Eu fui pra virada do Paraná sozinho e não aguentei esperar pelo David Jackson. De manhã após show do Mão Morta, com corpo e mente destroçados fui pra rodoviária quase morto. Mas se eu tivesse ficado pra ouvir Killer, Sleepwalkers e Man-Erg, morreria por certo!

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  4. Eu estava lá. Cheguei atrasado para o Nektar mas peguei o David Jackson completo. Até levei e gravei o show com meu Zoom H4n mas o som estava muito ruim. O pessoal acha que show de Rock TÊM que ser no último volume. Assisti a outro show no dia 26 na Virada de Santos e o som esta ótimo. Nunca tive uma semana tão prog rock fechando com chave de ouro com o Gong no Sesc Belenzinho dia 24. È isso aí. Pena que dificilmente veremos toda esta galera de novo. É o fim de uma era que aos poucos deixa de ser "ao vivo".

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