Em 1978, o americano Stephen Leigh escreveu a noveleta
“When We Come Down” (“Quando Descemos”), que foi publicada na coletânea
“Asimov’s Choice: Extraterrestrials & Eclipses” organizada pelo Profeta
Isaac (no Brasil: “Asimov: O Melhor da Ficção Científica”).
No conto, o personagem principal é um Bio-Piloto (BP), que
são seres humanos que foram submetidos a diversas intervenções cirúrgicas que
lhes alteraram as características básicas. Um BP recebe enxertos espinhais
através de tomadas de entrada na nuca; seu cérebro, sistemas nervoso e somático,
sua motricidade, tudo é alterado de forma a ser acoplado / conectado ao sistema
de controle de uma nave espacial, formando com ela uma singularidade.
Os Bio-Pilotos são vistos como aberrações, pois
caminham claudicantes, curvados e de forma trôpega, tendo pouco controle motor quando
seus corpos estão sob a gravidade dos Planetas; são considerados repulsivos, aleijões,
corcundas e aberrações. São hostilizados e ridicularizados. Ganham fortunas,
mas pagam o altíssimo preço da segregação.
Tudo se transforma, no entanto, quando estão conectados
a suas naves, e no comando delas: “Uma vez ligados, somos mais mente presa a
metal frio do que carne viva”. O BP é o cérebro da nave espacial, e “sente”
tudo o que ela registra, tem plena consciência de cada um de seus sensores,
radares, cada junta, cada reservatório, cada sistema de alimentação. Quando
estão integrados a suas naves e viajando pelo Espaço é quando se tornam senhores
de si, com os sentidos amplificados e alavancados pela brutal força mecânica.
São finalmente livres. Uma nave com um Bio-Piloto é um ser vivo. Detectam todo o
cosmos a milhares de quilometros de distância. Voam como queiram, sem nenhum
controle além de suas próprias consciências e desejos, à velocidades
estrondosas, e sem que ninguém lhes possa comandar - são naves vivas. É em vôo
que finalmente são felizes, sozinhos, isolados, em silêncio, infinitamente
distantes dos comentários mesquinhos daqueles que não os entendem e os
ridicularizam. Estão limitados apenas pelo Universo.
Li este conto com cerca de 23 anos, e jamais o esqueci.
E até hoje, em todas as vezes em que ando de moto - sem garupa - sinto o prazer
de me transformar em um Bio-Piloto.
(Nota - O início do
conto dá a deixa para o título e uma medida de seu tom sombrio:
“Por alguma estranha
razão, parece ser sempre noite quando descemos. Criaturas das trevas, nós:
rindo e gritando para anunciar nossa presença indesejável para a neblina
noturna e as fachadas vazias a nossa volta. Não somos das mais graciosas
criaturas terrestres. (...)”)
(SP, nov/2013)
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