quarta-feira, 25 de agosto de 2010

O Molusko

Em 1985 fui com meus Pais ao Egito.

Um dos mais célebres souvenirs de lá é a confecção de camisetas, anéis e pingentes com seu nome grafado em "hieroglyphics".

Quando fui fazer uma camiseta e indagaram meu nome, respondi: -"Marcio."

O vendedor veio então com uma grafia proposta para a camiseta. Como sou tão desconfiado quanto cauteloso, fui conferir em um manual "The easy way to read & write Hieroglyphics" que tinha comprado (e que tenho até hoje, caso você se interesse em saber a grafia de seu nome em pharaônicos hieróglifos egípcios).

Descobri que em caracteres ocidentais a grafia proposta era "MARSIO".

Reclamei então que a letra correta seria um "C" (algo como uma tina, 'basket with handle') ao invés do "S" (uma corda ou pano dobrado, 'folded cloth' ou 'cord'); mas a resposta veio com uma sabedoria esfíngica:
- "Se você grafar com "C", quem ler vai pronunciar "MARKIO". Se você quiser obter a pronúncia que nos falou, deve grafar "MARSIO". Lembre-se que a linguagem falada é muitíssimo mais antiga do que a escrita. A escrita existe para representar aquilo que falamos. Atenha-se à pronúncia de seu nome, e então defina como ele será escrito."

É claro que as camisetas e pingentes foram grafados com "S".

Isto leva a matutar sobre as reformas ortográficas, usos de acentos e também letras diferentes com o mesmo som ou ainda o uso de uma mesma letra com diferentes sons. O vendedor egípcio estava absolutamente correto: o objetivo da escrita é registrar o falado, a essência do Ser Humano são as cordas vocais e não o papel e a tinta (ou telas e bits). Assim, o importante é que aquilo que estiver escrito transmita o que se pronuncia.

Por exemplo, uma palavra grafada com trema tem uma pronúncia diferente da grafada sem o trema. O bendito trema faz diferença, e somente incultos, iletrados e preguiçosos desejarão seu fim, optando pelo empobrecimento e limitação da Língua Portuguesa e favorecendo a ignorância.

A recente reforma ortográfica favoreceu que ao ler uma palavra não saibamos como pronunciá-la. Ao invés de se tentar aumentar a cultura, optou-se pelo caminho mais fácil de dizimar as diferenças. Lembremos de "1984": quanto menor a capacidade de expressão de um povo, mais fácil controlá-lo e subjugá-lo.

Só mesmo um Presidente Molusco para aprovar uma atrocidade destas, que nivela por baixo o País e a Cultura.

E, neste caso, o "C" tem som de "K", mesmo. MOLUSKO!


Nota: Desde sua gênese, "Um Panda Em Saturno" opta pela grafia pré-Reforma Ortográfica, entendendo que assim a Língua Portuguesa é mais rica e culta.

(ago/2010)

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