quinta-feira, 17 de setembro de 2009

(China 2003 – 3 de 3) Rota da Seda, Hong Kong e meu primero tufão

O perrengue com a comida atingiu níveis extremos em um café da manhã em Huang Shan. Iam entupindo minha mesa com coisas cada uma mais esquisita do que a outra: ovo cru, umas bolotas que pareciam amendoim quente, umas ervilhas quentes apimentadas, uns vegetais verdes que pareciam minhocas verdes - talvez fossem - apimentadas, bolinhos brancos quentes parecidos com guiosas com recheio indefinível (não tive coragem de enfrentar), um troço que parecia tofu estragado, e outras coisas que a memória seletiva me impede de lembrar. A partir daí passei a carregar um papel com palavras básicas grafadas em chinês: café, leite, açúcar, pão, manteiga, geléia e faca. Não adiantou nada: no dia seguinte entreguei o papel em um outro hotel, e me trouxeram: café, açúcar... e uma faca! Quando esperneei (em inglês) com as garçonetes que NÃO ERA POSSÍVEL um restaurante não ter leite, me trouxeram um pires com uma rapa de leite condensado! E quando insisti no pão, me ofereceram um hamburguer!!! Desisti, é claro.

Outra vez fui pedir um fried rice with mushrooms and vegetables, mas eu não queria o arroz fried, e sim baked. Expliquei que queria aquele prato, mas com o arroz cozido e não frito. A garconete repetiu:
- "Este prato. Arroz cozido. Não é este prato."
- "SIM, é este prato, é galinha, são cogumelos, são vegetais, é arroz - só que cozido, e não frito. O arroz é cozido igual ao deste outro prato aqui (e mostrava o prato de cima no cardápio). Mas só o arroz é diferente; o resto é este prato mesmo".
O diálogo durou 10 minutos, ela repetiu 3 vezes o que eu pedi, fez que sim com a cabeça, e foi para a cozinha.
O arroz veio frito.

Com comida é sempre assim. Em um lugar turístico, que tinha banana split no cardápio, pedi que fossem duas bolas de chocolate e uma de vanilla - para quê!... Foi quase uma comoção no restaurante. As garconetes confabulavam. E se voltavam para mim. E ficavam me olhando. Eu explicava:
- "Three balls of ice cream, no? One chocolate; other vanilla; and the other, chocolate again!"
Elas se juntavam e confabulavam novamente. E se voltavam, para mim e faziam que sim com a cabeça. No final, uma foi até a cozinha. Daqui a 5 minutos, voltou e falou:
- "Sir, the banana boat has 3 balls of ice cream..."
Eu já estava preparado, e já tinha feito um DESENHO do banana boat, com setas escrito "banana", "ice cream", "chocolate", "vanilla" e "chocolate". Ela levou o desenho até a cozinha. Deu certo!

A vantagem das dificuldades com a comida é que estou com o corpo mais para Ney Matogrosso do que para Lula...

Yang Shuo é um lugar fantástico - , "o paraíso dos mochileiros". Além do visual maravilhoso de milhares de morrotes à beira de um rio sinuoso, as lojinhas de souvenirs são fantásticas. É uma mistura de Búzios, Campos do Jordão e Kathmandu. Finalmente comprei algumas coisas, de sedas maravilhosas e baratérrimas. O problema é que viajando de mochila, não há espaço para nada (ainda mais depois que comprei mais uma gigantesca bota de trekking).

Já Hong Kong está sendo uma tremenda decepção. Parece uma mistura de São Paulo com New York, cidade grande entupida de lojas carérrrrrimas, só grife, prédio, carro, ônibus, barulho, asfalto, shopping, prédios gigantescos, um horror. Após 12 dias imerso em uma China milenar estou agora em meio à escravidão absoluta ao dinheiro, só compras compras compras. Também aqui tive dificuldades com a comida, pois ou encontrava muquifos com cara de imundos ou então restaurantes finérrimos entre um Armani e um Ferragamo... Me lembra a chegada a Las Vegas, imediatamente após visitar Yosemite, o Parque das Sequóias, o Kings Park e atravessar o desértico Death Valley... Mas talvez seja este mesmo o significado desta cidade - me questionar o quê estou fazendo em São Paulo...

Hoje o dia estava horroroso, ventando e chovendo, fui visitar as lojas. Quase enlouqueci com as lojas de calçados para outdoor, vou acabar comprando mais outra bota. Também a HMV Records me tirou do sério.

Ventava e chovia cada vez mais, e fui ao Space Museum. Após a visita - com direito a treinamento de astronauta, passeio por superfície lunar com 1/6 de meu peso, uso de cadeira de deslocamento no espaço (de dificílimo manejo), uso de giroscópio e uma sensacional simulação de como funcionam os campos gravitacionais - eu ia entrando no Planetário e era a única pessoa. O porteiro me perguntou:
- "Você... está sabendo do tufão?"
Pois é, daí tanta chuva e vento, HK está em alerta contra um tufão que se abaterá sobre a cidade dentro de algumas horas. Foi impressionante ver a cidade vazia às 8 da noite, lojas fechadas, uma tremenda ventania quente.

Neste momento (10 da noite de quarta-feira em Hong Kong, 11 da manhã no Brasil) estou em um lugar inacreditável – um cyber cafe em Hong Kong com mais de 100 chineses jogando war games ou coisas parecidas, um esporro infernal, ambiente o mais blade runner possível. Querendo dar uma checada de curiosidade, o e-ndereco é: http://www.cyber-pro.com.hk/

Fiz a barba pela segunda vez na viagem - de vez em quando fico parecendo um urso, e aí chamo ainda mais a atenção.

Estou bastante magro, com o cabelo enorme - horroroso mas eu gosto - bronzeado, expressão de aventura e liberdade, e pernas que me levam por qualquer trilha e para qualquer montanha.
Saudações,
Guedes-Lin

(23/jul/2003)

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