terça-feira, 15 de setembro de 2009

O Demolidor

Na condicão de tradutor juramentado do Demolidor (DareDevil) durante alguns números da revista nos anos 80, não pude resistir ao lançamento do filme, e fugindo às demandas insanas do Mestrado fui ao cinema no final de semana de estréia.

A caracterização do DD está muito boa, sua movimentação pela tela é igual à dos quadrinhos. Para mim o ponto alto é a visualizacão da percepção do cego, que os quadrinhos nunca souberam – ou puderam – transmitir, e que o filme mostra à perfeicão. Como pode um cego, mesmo com os sentidos amplificados, “sentir” o mundo através da audição? Pois o filme nos mostra, de forma brilhante.

A tragédia de Matt Murdock está lá, com o acidente que lhe tirou a visão um pouco alterado – originalmente eram cilindros de isótopos radioativos. Este detalhe é importante devido a uma curiosidade - evidentemente não mostrada no filme – de que exatamente o mesmo acidente que cegou e deu poderes a ele foi também o acidente que conferiu poderes às Tartarugas Ninjas: elas estavam em um esgoto próximo ao local do acidente, e também foram afetadas / contaminadas pelos mesmos bastões radioativos; a diferença é que não foram atingidas nos olhos, e portanto não perderam a visão. Provavelmente a pergunta que o advogado parceiro de Matt Murdock faz o tempo todo (“Existem jacarés nos esgotos de NY?”) é uma coincidência; mas não deixa de ser uma referência à origem das Tartarugas Ninjas.

A relação com Elektra é muito intensa, e mantém toda a trágica história familiar e pessoal da personagem original. Elektra em si foi no entanto bastante alterada: ela era uma ninja assassina renegada por seu Mestre, amargurada e angustiada, em busca de aceitação e ao mesmo tempo fugindo do mundo, silenciosa e furtiva, invisível como os ninjas; no filme ela é quase uma dançarina de kung fu... Suas sensualíssimas roupas vermelhas esvoacantes estão lamentavelmente alteradas no filme, tornando-se couro preto e tirando todo o charme da ninja – alias, a "ninja assassina" não mata NINGUÉM no filme!...

O Mercenário está muito bom, mas o Rei do Crime – embora excelentemente caracterizado – era originalmente branco, e não o negão do filme. Talvez não tenham encontrado ninguém tão adequado ao papel quanto o ator escolhido; mas trata-se de uma alteração dramática quanto ao personagem original.

Traduzi O Demolidor quando ele enfrentava uma espetacular adversária: Schizoid Mary, uma deliciosa alucinada com dupla personalidade, com enorme cabelo encaracolado e a metade esquerda do rosto pintada de branco, que como enfermeira conquistou Matt Murdock e como Schizoid Mary conquista o Demolidor, ou seja: cada personalidade dele se apaixona por uma personalidade dela. Como enfermeira ela é um doce e também apaixonada por ele, mas como Mary Esquizóide ela não se importa, e como ele não sabe como reagir a ela, dá-lhe MUITA PORRADA!... Como o Homem Sem Medo apanha de Schizoid Mary! (E é claro que o Rei do Crime se aproveita da situação). Foram momentos brilhantes do DareDevil, na época criado, produzido e desenhado por Frank Miller. Espero que um segundo filme do advogado católico cego que se veste de diabo em couro vermelho para fazer justiça na noite traga a Esquizóide à luz do dia, ou melhor, aos reflexos de seus ecos.

(mar/2003)

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